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Florianópolis (Rio Vermelho - Norte da Ilha) - 12 de Agosto de 2018 - Mercado Ilhota - 07:54 P.M.
Espero que este não seja o último registro de nossa equipe. O que era pra demorar no máximo 15 min se tornou incerto.
Enquanto recolhíamos mantimentos ouvimos tiros lá fora e alguns segundos depois o Carlos, que estava esperando no carro, entrou correndo pela porta arrombada puxando as gôndolas para bloquear a entrada como pudesse. Estava em pânico, mesmo sendo moreno estava branco tal como nunca o vi. Sabíamos que algo grande havia acontecido mas não tínhamos respostas dele às nossas perguntas. Usualmente era o mais calmo entre nós e agora estava ali, em choque. Depois de alguns minutos ele falou "UMA HORDA!". Ele viu um outro grupo entrar em um outro galpão próximo e se encolheu no carro para ficar observando. Logo após alguns tiros começou o movimento. Eram gritos de horror e dor e por entre a neblina ele via algumas dezenas de vultos saindo do galpão, indo em todas as direções. Ele sabia que se ficasse no carro, cedo ou tarde o pegariam. E ele não iria fugir com o carro e nos deixar para trás. No nosso grupo, ninguém fica para trás se ainda existir alguma chance de sobrevivência.
Decidimos vasculhar os cômodos internos do mercado pois uma gôndola de vendas no lugar de uma porta não representa muita segurança, ainda mais contra uma horda. Precisávamos achar um local seguro até que a horda ou a neblina dissipasse. Também estávamos preocupados com um ataque de um outro grupo de sobreviventes. Os poucos recursos que carregamos conosco e os que encontramos já são um grande tesouro para qualquer grupo de sobreviventes.
Descobrimos que o mercado era ligado à uma residência aos fundos.
No caminho entre o mercado e a residência não encontramos ameaças mas, assim que entramos na casa fomos surpreendidos por uma família de mortos-vivos. Infelizmente nesse momento aconteceu o pior. Eu e o Rafael estávamos indo na frente e os desgraçados dos inanes estavam bem na lateral da porta. Um deles pulou em mim me derrubando enquanto outro jogou o Rafael contra a parede da sala. Foi tudo muito rápido mas parecia durar uma eternidade. Não podíamos disparar as armas ou a horda nos localizaria e invadiria o local então tínhamos que fazer uso dos facões e lâminas menores que carregávamos nos cintos. Eram uns cinco inanes, um acima de mim no chão, outro prensando o Rafael na parede e os outros três correndo para cima do Carlos e do Otávio, que ainda estavam passando pela porta. Nem eu nem o Rafael conseguíamos uma brecha para pegar nossas defesas nos cintos pois estávamos tentando afastar os inanes que tentavam nos morder de qualquer forma. Foram dois minutos eternos até que o Carlos e o Otávio conseguiram eliminar os cinco e nos socorrer. Foi nesse momento que tivemos uma triste constatação. Tanto eu quanto o Rafael fomos mordidos. Eu fui mordido na mão direita, logo acima dos punhos. Provavelmente na hora que me defendi do empurrão e levei a mão ao ombro do inane ele deve ter aproveitado a proximidade e me mordido. O Rafael foi mordido no ombro. Também não imaginava como poderia ter acontecido.
Depois de recebermos os primeiros-socorros trancamos todas as portas da sala. Eram três, uma que ia para a parte interna da casa, outra que ia para o jardim que ficava de frente para a rua lateral de onde viemos (o mercado fica em uma esquina) e a outra pela qual viemos do mercado.
Agora estávamos começando a arder em febre, vomitar e passar o pior mal-estar que se possa imaginar. O que quer que corra pela saliva e sangue dos inanes, age como um veneno. Quando um "vivo" entra em contato com esse sangue infectado ou saliva de forma a permitir um contato contagioso como mordidas, sangue infectado em contato com o sangue corrente do "vivo" ou até mesmo ingestão ou absorção de sangue infectado, o "vivo" pode reagir de 3 formas. Classificamos os "vivos" em 3 classes. Os cardíacos, os imunes e os infectáveis. Os cardíacos reagem quase que instantaneamente ao veneno e sofrem uma parada cardíaca, morrendo em menos de 2 minutos com o efeito do veneno. Os imunes sofrem com os ferimentos e como se tivessem uma doença forte que causa dores intensas, febre, vômitos, diarréia, anemia e alucinações. Mas estes, se conseguirem tratamento adequado, podem sobreviver. Normalmente se recuperam em uns três dias. Os infectáveis passam pela mesma reação dos imunes mas, em até vinte e quatro horas eles se tornam inanes. A maioria das pessoas são do tipo infectáveis, sendo seguidas pelos cardíacos e uma pequena parcela são imunes. Agora, particularmente estou rezando para sermos imunes pois o mundo pode estar o inferno que for, não queremos morrer! Está sendo muito difícil escrever este relatório, eu mal consigo segurar a caneta e além das dores é difícil se concentrar quando se pode estar a beira da morte, com seus colegas de facão em punho olhando fixo para você. Alguns infectáveis se transformam rápido, nunca se sabe quando vai ser o momento.
O plano é esperar esperar o dia amanhecer pois parou a garoa e a neblina está dissipando mas ainda é arriscado sair a noite, ainda mais com dois feridos e possíveis ameaças. Carregar todos os mantimentos correndo até o carro, em dois, e ainda levar os feridos, num território que se sabe estar ocupado por uma horda, é suicídio. Melhor deixar o dia amanhecer e aguardar os inanes procurarem abrigo contra a luz. Tomara que não procurem abrigo justamente aqui.
Eu prometi falar sobre os que já partiram e sempre relatar os fatos acontecidos pelo nosso grupo. Infelizmente não sei se conseguirei fazer isso então apenas espero que, se eu não sair dessa, alguém possa continuar o meu relato e que as boas coisas que nós, que não conseguimos continuar fizemos, sejam registradas e lembradas por aqueles que seguem em frente.
Quando estamos neste estado, nos lembramos de como era boa a vida no passado e a história vai nos chamando atenção às nossas decisões, aos amigos que fizemos, aos amigos que perdemos. O que mais dói é a lembrança dos que não pudemos salvar, que descansem em paz.
Como dói. Não aguento mais. O Rafael já desmaiou.
Finalizo o relatório de hoje em ansiedade, agonia e esperança. Obrigado a todos e perdoem-me pelas vezes que falhei...

oO"....Mell DELSlsSss.....Alguem salve agente....
ResponderExcluirOtavio