Apocalipse Zumbi - Capítulo III - Parte II



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Florianópolis (Parque Lagoa do Peri - Sul da Ilha) - 16 de Agosto de 2018
 - Abrigo #50 - 09:00 A.M.


     O dia estava clareando quando acordei. Acordei ouvindo sorrisos e vozes diferentes vindas de fora do abrigo, em direção à lagoa. Os pescadores estiveram ocupados a noite inteira e resolveram retornar só ao amanhecer. Parece que realmente as coisas são seguras por aqui. Acho que eu jamais ficaria embrenhado na mata tão relaxado quanto eles pareciam ter ficado.
    Dei um salto da cama para espiar os novos colegas. Eu estava dormindo em um quarto no térreo, logo ao lado da sala de entrada, então pude ver quando eles chegaram. Estavam felizes e carregando varas de pesca, um balde cheio de peixes e mais um arame que atravessava a boca e guelras de mais uns cinco peixes de tamanho maior. Na sala de entrada, os esperando, estavam a Ana e o Arthur.   Assim que entraram, em apenas um segundo dentro do ambiente, os rostos mudaram de expressão. Os cinco pescadores encararam assustados a presença do Archie, não esperavam ele ali. Ficaram com uma cara inquisitória, afinal, haviam saído em quatro para procurar o outro grupo que saíra alguns dias atrás em busca de sobreviventes e, de todos os nove que haviam deixado o abrigo (cinco no grupo inicial e quatro no do Archie), só ele estava agora na sala. Eles perceberam pela cara do Archie e da Ana que não tinham boas notícias para dar. Uma garota, mais baixa que os demais, de cabelos compridos, que entrara pulando na sala apenas olhou para o Archie e encheu os olhos de lágrimas. Ele só chacoalhou a cabeça baixa sinalizando que não. Ela desatou a chorar e saiu correndo porta afora. Eu odeio ver uma garota chorando. Não importa as atrocidades que vivenciei nos últimos meses, acho que nunca estarei pronto para ver uma garota chorando. Peguei minha mochila (sempre deixo uma mochila com água, alguma comida e remédios próxima a cama para emergências), abri totalmente a porta pela qual eu espiava os acontecimentos,  baixei a cabeça em sinal de cumprimento e pesar aos presentes, pedi licença e passei por eles em direção à porta de saída. Haveria tempo para ser devidamente apresentado, mas não achei que aquela seria a hora mais apropriada para isso, nem para longas explicações sobre "de onde veio este estranho".
     Saí e pude reparar pelos rastros na grama molhada pelo orvalho da manhã a direção de fuga da pequena moça. Ela fora em direção à lagoa e foi à beira dela que a vi após uns 10 minutos de caminhada. Estava sentada à beira d'água, em um pedacinho de areia que parecia uma pequena praia. Estava encolhida, segurando os joelhos e com a cabeça abaixada sobre as pernas. Não sei dizer se era uma cena linda ou triste. O dia estava ainda clareando, o Sol nascendo atrás dela, no horizonte, refletindo na lagoa à sua frente com todas as cores do céu.
    Sentei-me ao seu lado sem dizer nada. Estava com medo de que se assustasse comigo mas ela estava tão triste que, mesmo que eu fosse um inane, ela não se importaria. Passaram-se alguns minutos e eu sabia que ela já havia percebido não estar sozinha, então, soltei apenas um "Eu sinto muito". Ela levantou a cabeça. Seu rosto estava lavado em lágrimas, seus olhos inchados e, com sua voz trêmula e áspera me respondeu: "E quem é você para sentir muito por mim?". Aquilo me doeu o coração e não achei ser a hora para dizer que eu era o cara que teve que matar a própria mãe que estava se transformando. Em vez de respondê-la apenas tirei da mochila a garrafa com água e um pacote de biscoitos e deixei ao lado dela. Me levantei e fui dar uma volta à beira da Lagoa.
   Mesmo nesse pedaço de paraíso as pessoas choram. A pergunta que ela me fez e as memórias do que já havia passado e do que aconteceu à minha família agora também me faziam molhar o rosto e socar um tronco de árvore.
   A Ana me encontrou uma meia hora depois do meu episódio com a garota e me explicou o que acontecera. Ela disse que a garota se chama Aline e que a irmã dela estava no grupo do Archie que partira em busca dos demais. As duas estavam aproveitando as férias aqui quando tudo começou.
   Fui convidado a retornar ao abrigo e ser apresentado aos demais, Jonatha, Fernanda, Renata e Rogher, mas decidi ficar mais um pouco por aqui, à beira da lagoa. Pedi licença à Ana, que retornou ao abrigo, tirei meu diário da mochila e comecei a escrever. Se não começasse a escrever agora eu iria explodir. Escrever me acalma e me ajuda a manter o controle. E eu realmente estou abalado. Não consigo tirar as cenas desta manhã da minha cabeça. Agora vou encerrar por aqui e vou lá ver como todos estão. À noite eu escrevo mais.


Álisson Alves

Alisson Alves é o autor do Blog Gente Incomum, escritor, blogueiro, e nas horas vagas curte jogos online, tocar violão e ler.

5 comentários:

  1. Puts cada vez vc consegue nos envolver mais com essa historia, muito show!!!Parabens

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  2. Finalmente agora só falta a gente passar n joao gualberto né alisson auhuahuahauhauah

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  3. kkkkkk aí vai ter mais do que apenas zumbis (se não me engano não haviam zumbis na João Gualberto)

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